domingo, 4 de setembro de 2005

drama do cobertor antigo

Num belo dia, num reino aleatório distante, deparo-me com uma constatação tão triste que fez estalar a minh’alma. Era um ser que relatava algo do namoro de pouco mais de um ano como morno e conveniência de se estar um com o outro era a força que o mantinham juntos. No entanto nada foi mais grave do que a frase: estou com ele porque sei que não encontraria alguém melhor, assim como ele está comigo porque não encontraria uma pessoa melhor. Meu choque se deu à vista. Repeti a frase, e num arrepio que deu tratei de explicar ao meu jeito: então é assim, se estar com o outro porque não tem mais nada de interessante como opção?! Vieram então justificativas do tipo ‘estar sozinho é ruim’ e que a pessoa tinha ‘virtudes admiráveis’ e me atrevi a jogar pimenta no diálogo dizendo: e se alguém se dissesse apaixonado por você, te dando possibilitando sentir aquelas ‘magiquilidades’ de inicio de namoro novamente? Não, a pessoa não estava entregue a aventuras. O namoro estava morno dos mais secos e o ‘não ficar sozinho’ e o medo de ‘não encontrar alguém melhor’ imperava.

Agora vou eu nas minhas confabulações pensar: e se alguém estivesse comigo por mera conveniência, daí quando encontrasse alguém ‘melhor’ partiria a galope deixando um bilhetinho lilás de despedida breve? Digo que outra pessoa o faria, porque não me imagino com um ser e paralelamente esperando um príncipe encantado vir me resgatar e me tirar da suposta tortura.

Será que é regra depois de um tempo os namoros sucumbirem ao mofo da mesmice? Sinceramente eu penso que não, como até vejo por aí uns apaixonados que buscam a si de maneiras diferentes, olhares diferentes e vão se descobrindo boa surpresa um para o outro e fazendo do relacionamento um vinhedo de qualidade.

Cada relacionamento é um mundo, mas daí as pessoas se tratarem como num mercado de pulgas: ‘ah, se eu encontrar um cobertor melhor eu devolvo esse’. Não se consegue viver sem coberto então? Mesmo em profunda tristeza as pessoas se limitam àquele cobertor que não querem mais na certeza de que um dia ‘encontraram um melhor’. Sonham com o dia do cobertor passado ir pro lixo, afinal não esquenta mais mesmo, contudo não vêem que enquanto mantiver este cobertor antigo consigo nunca vão conseguir se desvencilhar dele.

Que não nos limitemos aos cobertores velhos, as estações que passaram, aos céus que só podem ser azuis.

2 comentários:

Tiago Tresoldi disse...

É claro que muitos relacionamentos são mantidos por algum tipo de conveniência, quer pessoal, quer econômica, quer até mesmo egoísta. E também é certo, pode até haver gente que se sente melhor sozinha, mas a grande maioria de nós precisa mesmo de um alguém em quem apoiar-se.

Mas também de pouco vale faler de relacionamentos; no fundo começo a entender que o relacionamento é quase uma pessoa à parte, um Arlequim construído com pedaços dos dois e com sobras de todos à volta. E caso vire um fado ou uma conveniência, os dois realmente não mudam tanto: esse é o verdadeiro sentido do dizer que muitos matam o "nós" para não perder o "eu" e o "tu".

Lembras da história do Prometeu, que em punição por ter entregue o fogo aos homens tinha o fígado comido cada dia e a cada dia renascia? É algo assim mesmo, um morrer e renascer, mesmo que da mesma forma a cada dia. Quem espera a hora de jogar o cobertor fora é porque realmente nunca gostou tanto do cobertor e, nas noites de inverno, é sempre melhor um cobertor que um mero lençol, mesmo que seja de linho e todo ornado.

Aquilo que eu ria de minha época de perdido na selva escura, aquilo de "os engenheiros não vivem, funcionam" é mais ou menos a explicação para tudo. Tolos estes que imaginam que nossa vida não modifica tanto nossa personalidade: é exatamente por se acostumarem na vida a buscar pelo melhor disponível e não pelo bom que se acostumam a isso.

Não sei porque te espantas tanto apenas com os relacionamentos. Olha à tua volta, na tua turma de Letras; faz algumas perguntas rapidinho e verás que muitos (senão a maioria, infelizmente) está aí apenas porque "não tinha nada melhor, e de qualquer forma é preciso se formar". Vamos até para as banalidades, como a música que está tocando não ser tão boa, mas não chega a ser ruim e não sei direito o que quero, e procurar a que quero é trabalhoso, toma tempo, estou com preguiça... E na política então? E até mesmo em banalidades como ver um jogo de futebol de um país remoto do qual pouco conhecemos, escolhendo um time pelo mero prazer de torcer para alguém?

Início de namoro é bom, claro, mas namoro longo também. No meu caso então que privilégio: se contares bem, vendo e convivendo em tudo com a Dani todos os dias, quase quase é mais que um namoro de 15 meses. E poucas coisas podem contar tanto quanto a intimidade.

Afinal de tudo, a verdade é que não quero funcionar, quero viver. Talvez todos queiram.

Lizi disse...

Sin City é muito bom mesmo :DDDD
Ví hoje com a Lú e me lembrei de ti ;)

Amanhã eu comento sobre o post e falo sobre amores capitalistas :P

Beijão!